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Especialista explica riscos da falta de segurança de dados para crianças e jovens

Especialista explica riscos da falta de segurança de dados para crianças e jovens

Karolina Grabowska/Pexels/Agência Unico

AGÊNCIA DE COMUNICAÇÃO Conteúdo de responsabilidade da empresa 7 de junho de 2023


Especialista em privacidade, Yasodara Cordova, conta como se precaver principalmente no mundo online

Com as inovações tecnológicas e principalmente a conectividade oferecida pelos celulares, é crescente o número de crianças e jovens que passam grande parte do tempo diante das telas. Recentemente, a novela “Travessia”, da Rede Globo, trouxe à tona o debate sobre os perigos reais que jovens estão expostos no mundo virtual. Na trama, a personagem Karina, interpretada pela atriz Danielle Olímpia, torna-se vítima de um pedófilo, que explora a tecnologia para enganar a jovem.

O enredo serve como referência para alertar pais e responsáveis sobre a importância do diálogo com os filhos, assim como o cuidado com a privacidade e a preservação dos dados pessoais.

“Como adultos, é nossa obrigação proteger os dados de crianças de qualquer uso inadequado que possa ser feito, e mantê-las com o direito a uma vida privada até que tenham discernimento para decidir se querem ou não ter seus perfis exibidos na internet”, explica Yasodara Cordova, pesquisadora-chefe de Privacidade na Unico, empresa especializada em identidade digital.

Com vasta experiência acadêmica e estudos desenvolvidos até mesmo na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, Yasodara não se limita ao ambiente universitário. Voz ativa na defesa da privacidade na internet há mais de 15 anos, a especialista integrou a força de inovação digital no Banco Mundial e foi membro do Conselho Consultivo de Segurança da TikTok no Brasil antes de se juntar à Unico.

Dada a importância de promover a segurança de dados e proteção da privacidade on-line, a especialista concedeu uma entrevista à Agência Unico. Confira os destaques:

Agência Unico: Crianças estão tendo acesso a equipamentos digitais cada vez mais cedo. Como os pais devem lidar com esse acesso? A partir de quando seria seguro deixar um celular com uma criança?

Yasodara Cordova: De acordo com o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), alguém é considerado criança até os 12 anos. Não à toa, a maioria das redes sociais e aplicativos só permitem a entrada como usuários a partir dos 13 anos.

Antes disso, não é recomendado que a criança fique com um aparelho celular ou computador sem supervisão de uma pessoa adulta. Isso porque as redes sociais apresentam mecanismos que incentivam a liberação rápida de dopaminas, entre outros neurotransmissores, que afetam o ciclo de desenvolvimento infantil em várias áreas, inclusive de aprendizado.

Além disso, muitos celulares e tablets ainda não vêm com a proteção contra a luz azul, que modifica o ciclo circadiano do sono da criança, trazendo vários prejuízos para o desenvolvimento físico infantil.

Finalmente, a supervisão é importante porque, a depender do ambiente no qual a criança está navegando, ela pode ter acesso a conteúdos não apropriados para sua idade e que também podem afetar negativamente o seu desenvolvimento.

A partir dos 13 anos já é possível que a criança tenha seu próprio aparelho e navegue de modo independente. Mesmo assim, é recomendado que os pais mantenham uma linha de comunicação aberta com seus filhos adolescentes sobre os perigos e as vantagens do uso da internet, especialmente de plataformas de social media.

Agência Unico: Como manter a segurança e privacidade dos dados de crianças e adolescentes?

Yasodara Cordova: A mesma importância que se dá ao não deixar uma criança pequena sozinha em um shopping center, por exemplo, deve ser dada aos dados das crianças. Como adultos, é obrigação proteger os dados de crianças de qualquer uso inadequado, e mantê-las com o direito a uma vida privada até que tenham discernimento para decidir se querem ou não ter seus perfis exibidos na internet.

O chamado sharenting, ou quando os pais colocam toda a vida da criança on-line, comprovadamente traz danos psicológicos e retira da criança a decisão de ter ou não um perfil em rede social. Temos que ter em mente que a web é, de certo modo, pública. Todas as fotos, dados e documentos que são colocados em redes sociais podem ser printados ou fotografados por seguidores ou amigos com acesso à conta sem restrições.

Já os adolescentes estão expostos a outros tipos de risco, e a sua consciência digital deve ser desenvolvida desde cedo. Posso citar os perigos dos mecanismos das mídias sociais, que podem induzir comportamentos a partir da exposição a determinados conteúdos, como é o caso da anorexia, por exemplo. Além disso, os jovens estão expostos a predadores sexuais, bullying, revenge porn, entre outros.

A privacidade, que envolve o ensino de ferramentas de controle de imagem e dados on-line, deve ser uma disciplina ensinada logo cedo para que as pessoas tenham mais discernimento ao compartilhar e consumir conteúdos on-line.

Agência Unico: Quais os cuidados que esses pais devem ter para acompanhar o uso desses equipamentos?

Yasodara Cordova: Muito se fala sobre aplicativos de controle parental, mas eu não acredito que resolvem o problema, pois eles geralmente trazem controles bem básicos e facilmente burláveis pelos adolescentes. Uma cena comum, inclusive, é o adolescente ter acesso à senha dos pais para resolver pequenos problemas digitais para eles.

Vale também dizer que muitos aplicativos de controle parental por si invadem a privacidade das crianças e adolescentes ao coletar dados em excesso, invadindo a privacidade de modo igualmente negativo. Existe também a possibilidade de vazamento desses dados, caso as empresas não sejam de procedência aceitável e, portanto, é importante verificar sempre o fabricante de aplicativos de controle parental.

O ideal é que se busque uma VPN confiável e um antivírus adequado para os adolescentes e se promova a literacia digital. É importante que os adolescentes saibam que têm direitos e que as empresas não podem coletar dados das pessoas sem autorização e transparência, para que eles tenham cuidado com seus dados.

Agência Unico: Como os pais devem fazer o monitoramento? Particularmente, tive uma situação quando minha filha tinha 11 anos. Um estranho tentou comunicação com ela. Mas, orientada, ela bloqueou a pessoa e me avisou. Vemos diversos casos semelhantes, inclusive foi até assunto em novela da Globo.

Yasodara Cordova: A internet acelerou a introdução das crianças ao convívio aberto com todo tipo de gente, e infelizmente apenas agora os pais estão aprendendo a lidar com o acesso de suas crianças e adolescentes às mídias sociais. O caso demonstra que a ferramenta mais poderosa é a educação.
A segunda ferramenta mais poderosa é cobrar das empresas o correto tratamento dos dados, com transparência, dando o controle para as pessoas donas dos dados, de modo que sempre saibam com quem, para quê e até quando seus dados estão sendo compartilhados.

É importante que as pessoas denunciem esses casos para as plataformas de mídias sociais. Caso algo mais sério ocorra, devem recorrer às autoridades competentes e fazer a denúncia. Sobre dados e privacidade, é importante ter o máximo de cuidado com fotos, dados de documentos, dados de localização, endereço e telefone das crianças e adolescentes para evitar a sua exposição a fraudadores e criminosos.

Agência Unico: Nem sempre o monitoramento é tarefa fácil, principalmente no caso dos adolescentes. Há muitos casos de cyberbullying, por exemplo. Como os pais devem proceder? Como abrir caminho para conversas difíceis, mas necessárias e até manter o `controle’ sobre o que fazem no mundo digital? Ou seja, como transitar por essa linha tênue sem cair na repressão ou no descaso?

Yasodara Cordova: Não acredito que dê para manter o controle (risos). Sempre falo isso porque também tenho um filho adolescente e não tem como vigiar constantemente o que ele faz na internet. A fase mais importante é até os 12 anos, quando as crianças devem aprender como funcionam os algoritmos de recomendação e o funcionamento básico das plataformas, e entendam que é ruim para elas ficarem o dia todo nas telas.

Por isso, a educação digital nas escolas é tão importante. Não é só aprender ferramentas, mas aprender como funciona a internet, para onde vão seus dados, quem cuida deles e o que pode acontecer se ficarem à disposição. Já os casos de cyberbullying seguem comportamentos incentivados culturalmente em ambiente escolar ou até familiar.

Para a diminuição desses casos, é importante a sociedade entender que os impactos negativos de preconceitos enraizados são amplificados na internet. Então, se o professor faz vista grossa para uma piada com crianças gordas, deficientes, magras, altas, baixinhas ou pretas, por exemplo, a criança vai entender que aquilo é aceitável e vai repetir no ambiente on-line.

O problema é o efeito “swarm”, facilitado on-line pela escala das ferramentas. Se na escola três crianças praticam bullying em outra criança, na internet serão três mil. Precisamos de uma revolução na educação em todos os sentidos para diminuir os casos de cyberbullying.

Agência Unico: Quais dicas/conselhos podemos dar para os pais?

Yasodara Cordova: Eu diria que é importante não compartilhar imagens de seus filhos on-line, até que tenham idade para dar permissão. A mesma coisa para o cuidado com os dados. É bom lembrar que os dados de crianças são “limpos” e, portanto, visados por fraudadores. Além disso, até os 16 anos não existe registro biométrico de título de eleitor ou licença para dirigir.
O cuidado com os dados de crianças e adolescentes precisa ser redobrado, pois estamos falando de sua identidade digital, algo que é impossível de ser trocada.

Agência Unico: Já vivenciou situações semelhantes em família? Como lidou?

Yasodara Cordova: Nunca tive esse problema em família, mas, quando pesquisava radicalização política via Youtube, o meu time encontrou casos de vídeos de crianças pequenas em situações normais sendo exploradas no Youtube por uma rede de predadores sexuais.

Eu mesma nunca imaginava que era tão sério. Porém, é impressionante como a exposição atrai fraudadores e outras figuras danosas. Como consequência da nossa pesquisa, o Youtube modificou seus algoritmos e os canais onde os vídeos eram exibidos foram apagados.

Entretanto, ficou a lição do perigo que as plataformas podem representar, especialmente para crianças pequenas.

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